Controle Semântico: Uma estratégia argumentativa cada vez mais importante
Controle Semântico
Eu já tinha escutado sobre a manipulação por rótulos na faculdade e como isso foi utilizado para criar estratégias de etiquetamento criminal (labeling approach). Essa abordagem, desenvolvida por teóricos como Howard Becker, demonstra como rótulos sociais podem determinar trajetórias criminais. Lombroso, com suas teorias controversas sobre o “criminoso nato”, exemplificava como pré-definições podem moldar não apenas percepções, mas destinos.
Mas foi a leitura de Making Your Case: The Art of Persuading Judges, de Antonin Scalia e Bryan Garner, que verdadeiramente transformou minha compreensão sobre esta técnica argumentativa:
Labels are important. That’s why people use euphemisms and why names are periodically changed. And that’s why you should think through the terminology of your case. Use names and words that favor your side of the argument.
Rótulos são importantes. É por isso que as pessoas usam eufemismos e por que os nomes são periodicamente alterados. E é por isso que você deve pensar cuidadosamente sobre a terminologia do seu caso. Use nomes e palavras que favoreçam seu lado do argumento.
No livro o autor exploca como o uso sutil de etiquetas podem mudar toda a semântica de uma situação e trazer uma carga implicita de simbologia ao cenário que está sendo trabalhado
Incidente vs. Desastre
Nem sempre o etiquetamento é sobre pessoas, mas pode ser sobre eventos. Um exemplo que me chamou a atenção no livro foi de um acidente ambiental ocorrido nos Estados Unidos.
O autor aponta que desde o início o representante da empresa chamou o evento de “O incidente”, o que acabou “pegando” inclusive durante o processo judicial. Provavelmente a situação seria diferente se o termo fosse “o desastre” ou o “crime ambiental”. Perceba a simbologia e a carga que cada termo traz.
Aplicação no Direito
Depois de ler esse capítulo, passei a redobrar meu cuidado com a semântica nas minhas petições, transformando nomes padronizados do direito em nome das partes interessadas e criando sutis pontos que garantem uma melhor argumentação implícita.
Perceba alguns exemplo:
- Pai dedicado x Genitor (qualificação emocional)
- Lar destruído x Imóvel danificado (ancoragem emocional)
- O agressor atacou Maria x A denunciante foi agredida pelo denunciado (voz ativa);
Mas não exagere! Use esses termos com parcimônia e sabedoria. Do contrário sua petição corre o risco de ser sentimentalista e até ridícula. Você pode intercalar alguns termos comuns do direito com essa técnica para não ficar massante.
Persuasão x Manipulação
Mas o mais importante, foi aprender a me defender contra o uso deste argumento, que também pode ser considerado uma falácia, dependendo da forma que é empregado.
Essa técnia é usado ao extremo por uma argumentação vazia e que foge do argumento e a utiliza como forma de ataque a pessoa e não a ideia, semelhante a argumentação por medo e vergonha que eu já relatei aqui.
É mais fácil combater uma pessoa etiquetada e anular todo o seu raciocínio do que de fato enfrentar seus argumentos.
Na era das redes sociais e da comunicação instantânea, o controle semântico tornou-se ainda mais poderoso. Hashtags, memes e slogans são formas concentradas desta técnica. Observe como diferentes grupos políticos e sociais nomeiam os mesmos eventos.
Conclusão
O controle semântico é uma ferramenta poderosa que permeia todas as esferas da comunicação humana. Desde salas de tribunal até manchetes de jornais, desde debates políticos até conversas cotidianas, as palavras que escolhemos moldam realidades.
A partir de agora, convido você a desenvolver uma consciência aguçada sobre esta técnica. Observe como diferentes meios de comunicação reportam o mesmo evento. Note como advogados, políticos e formadores de opinião escolhem cuidadosamente seus termos. Perceba quando alguém tenta substituir argumentação sólida por rotulação emocional.
Mais importante ainda: quando você identificar o uso manipulativo do controle semântico, não hesite em expô-lo. Pergunte: “Por que você está usando esse termo específico?” ou “Podemos discutir o mérito do argumento sem rótulos?”
A linguagem é poder, é mágica. Use-a sabiamente, defenda-se conscientemente, e nunca subestime o impacto de uma única palavra bem escolhida – ou mal-intencionada.